domingo, outubro 29, 2006

As Três Velhas


Era uma vez três irmãs, todas as três jovens: uma tinha sessenta e sete anos, a outra setenta e cinco e a terceira noventa e quatro. Essas moças possuíam uma casa com um belo balcão, e este balcão tinha um buraco no meio, para ver as pessoas que passavam pela rua. A de noventa e quatro anos viu passar um lindo jovem; depressa, pegou seu lencinho mais fino e perfumado e, enquanto o jovem passava sob o balcão, deixou-o cair. O jovem recolheu o lencinho, sentiu aquele odor suave e pensou: " Deve ser de uma belíssima donzela". Deu alguns passos, voltou e tocou a campainha da casa. Uma das três irmãs veio abrir e o jovem lhe perguntou:
- Por favor, nesta casa reside uma moça?
- Sim, senhor, e não é só uma!
- Faça-me um favor: gostaria de ver a que perdeu este lenço.
- Não, sabe, não é permitido - respondeu ela - , nesta casa é costume não poder ver a mulher antes do casamento.
O jovem já se deixara envolver, imaginando a beleza daquela moça, e disse:
- Não faz diferença. Casarei com ela mesmo sem vê-la. Agora vou ter com minha mãe para lhe dizer que encontrei uma belíssima jovem e quero desposá-la.
Foi para casa e contou tudo à sua mãe, que lhe disse:
- Querido filho, pense bem no que faz, cuidado para não ser enganado. Antes de fazer uma coisa dessas é preciso pensar bem.
E ele:
- Para mim dá no mesmo. Palavra de rei não volta atrás. - Pois aquele jovem era um rei.
Volta à casa da noiva, toca a campainha e sobe.
Aparece a mesma velha e ele lhe pergunta:
- Só uma coisa, a senhora é a avó dela?
- Sim, sim: a avó dela.
- Já que é avó dela, faça-me este favor: mostre-me pelo menos um dedo daquela moça.
- Por enquanto não. é preciso que venha amanhã.
O jovem se despediu e foi embora. Assim que ele saiu, as velhas fabricaram um dedo falso, com um dedo de luva e uma unha postiça. Entretanto, roído pelo desejo de ver aquele dedo, ele não consegui dormir à noite. Amanheceu, vestiu-se, correu até a casa.
- Senhora- disse à velha - , estou aqui: vim para ver o dedo de minha noiva.
- Sim, sim - disse ela - , já, já. Poderá vê-lo por este buraco da porta.
E a noiva exibiu o dedo falso pela fechadura. O jovem viu que era um belíssimo dedo; deu-lhe um beijo e colocou nele um anel de diamantes. Depois, loucamente apaixonado, disse à velha:
- Vovó, fique sabendo que desejo casar o mais breve possível, não posso mais esperar.
E ela:
- Amanhã mesmo, se quiser.
- Muito bem! Caso amanhã, palavra de rei!
Ricos como eram, podiam providenciar as núpcias de um dia para o outro, já que não lhes faltava nada; e no dia seguinte a noiva se preparava com a ajuda de suas duas irmãzinhas. O rei chegou e disse:
- Vovó, estou aqui.
- Espere aqui um momento, que já vamos trazê-la.
As duas velhas vieram conduzindo a terceira pelo braço, coberta por sete véus.
- Lembre-se bem - disseram ao noivo - , até chegar ao quarto nupcial, não é permitido vê-la.
Foram à igreja e casaram-se. Depois o rei queria que participassem de um banquete, mas as velhas não permitiram.
- Sabe, a noiva não está habituada a estas coisas.
E o rei teve que calar-se. Não via a hora que chegasse a noite, para ficar sozinho com a esposa. Mas as velhas acompanharam a mulher até o quarto e não o deixaram entrar porque tinham que despi-la e colocá-la na cama. Finalmente ele entrou, sempre com as duas velhas atrás, e a esposa estava debaixo das cobertas. Ele se despiu e as velhas foram embora levando o candeeiro. Mas ele trouxera uma vela no bolso, acendeu-a e quem encontrou pela frente?
Uma velha decrépita e enrugada!
A princípio, ficou imóvel e sem palavras devido ao susto; depois, foi tomado de uma raiva tão grande, que agarrou a mulher com violência, levantou-a e a fez voar pela janela.
Sob a janela havia uma pérgola de uma vinha. A velha arrebentou a pérgola e ficou pendurada num pau pela fímbria da camisola.
Naquela noite, três fadas passeavam pelos jardins: passando sob a pérgola, viram a velha balançando. Diante de tal espetáculo inesperado, todas as três fadas explodiram em risos, tanto que no final sentiram a barriga doer. Mas, quando pararam de rir, uma delas disse:
- Agora que rimos tanto às suas custas, temos que lhe dar uma recompensa.
E uma das fadas adiantou-se:
- Claro que vamos lhe dar. Ordeno, ordeno que você se torne a mais bela jovem que se possa ver com dois olhos.
- Ordeno, ordeno - disse a outra fada - que você tenha um belíssimo marido que a ame e proteja.
- Ordeno, ordeno - disse a terceira - que você seja uma grande senhora por toda a vida.
E as três fadas foram embora.
Assim que clareou, o rei despertou e se lembrou de tudo. Para certificar-se de que tudo não havia passado de sonho horrível, abriu as janelas para ver aquele monstro que havia jogado lá embaixo na noite anterior. E eis que vê, apoiada na pérgola da vinha, uma belíssima jovem. Pôs as mãos na cabeça.
- Coitado de mim, o que fiz!
Não sabia como fazer para trazê-la para cima; por fim, pegou um lençol da cama, jogou-lhe uma ponta para que pudesse agarrar e a puxou para o aposento. E quando a teve ao seu lado, feliz e ao mesmo tempo cheio de remorsos, começou a lhe pedir perdão. A esposa o perdoou e assim passaram a entender-se muito bem.
Depois de algum tempo ouviu bater.
- É a vovó - disse o rei. - Entre, entre!
A velha entrou e viu na cama, no lugar da irmã de noventa e quatro anos, aquela belíssima jovem. E essa belíssima jovem, como se não houvesse acontecido nada, disse-lhe:
- Mas como é que você se tornou assim tão jovem?
E a mulher:
- Silêncio, silêncio, por caridade! Se soubesse o que fiz! Deixei que me aplainassem!
- O marceneiro!
A velha voou até o marceneiro.
- Marceneiro, poderia me dar uma aplainada?
E o marceneiro:
- Oh, por Deus! Certo que a senhora é magra como uma tábua, mas se eu a aplainar, vai direto para o outro mundo.
- Nem pense nisso, senhor.
- Como: não penso? E depois que eu a tiver matado?
- Não pense nisso. Dou-lhe uma moeda de ouro.
Quando ouviu a palavra " ouro " , o marceneiro mudou de idéia. Pegou a moeda e disse:
- Deite-se aqui no banco que aplaino quantas vezes quiser. - E começou a aplainar uma bochecha.
A velha deu um berro.
- Como é que é ? Se gritar, não fazemos nada.
Ela se virou para o outro lado, e o marceneiro lhe aplainou a outra bochecha. A velha não gritou mais, estava morta.
Da outra nunca se soube que fim levou. Se foi sufocada, degolada, morta em sua cama ou quem sabe onde: não se pode saber.
E a mulher ficou sozinha em casa com o jovem rei, e foram felizes para sempre.

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